segunda-feira, 31 de março de 2014

Uma parada nessa rodovia sem acostamento

BR 101, entre Morro Alto e Osório, direção norte-sul

Engenheiros e gestores descobriram como asfaltar mais rodovias com menos dinheiro. Se construídas sem acostamento, seu custo diminui 40%, dizem. Não é o caso da BR na imagem acima. Conta-se que certa vez um indígena visitou uma grande cidade. Perguntou ao taxista por que homem branco coloca uma capa preta dura sobre a estrada. O taxista respondeu que essa capa preta chama-se asfalto e serve para a estrada ficar mais lisa, os carros poderem andar mais rápido e sem trepidar muito. Nesse momento o táxi atravessou um quebra-molas, uma lombada. O indígena, naturalmente, perguntou o que era aquilo. O taxista respondeu que aquilo chama-se lombada e serve para reduzir a velocidade porque faz o carro trepidar muito. O indígena finalmente perguntou: o que, afinal, homem branco quer, andar rápido ou devagar, trepidar muito ou pouco.


Esta parece ser uma questão de vida ou morte no século XXI. Vivemos num mundo onde parece que funcionar 24 h por dia não é mais suficiente. Quem tem tempo não é sério e quem não tem tempo é importante. Sonhamos com uma longevidade de 120 anos e não sabemos o que fazer com uma tarde de domingo. Estamos com incapacidade de parar e esta é uma forma de depressão. Cada pausa é preenchida com diversão e alienação. O lazer é feito de ocupações. A própria palavra entretenimento indica o desejo de não parar. O mundo está deprimido e a indústria de entretenimento cresce com isso. A internet e a televisão não dormem. Não existe mais insônia solitária. Solitário é quem dorme. As bolsas do ocidente e do oriente se revezam, mantendo suas atividades incessantes com base no ganhar e perder, nas informações e nos rumores. O meio ambiente e a terra imploram por uma folga. Nós mesmos não suportamos mais a falta de tempo. O fim do dia tem gosto de vazio. As montanhas estão com olheiras. Os rios precisam de um bom banho, as cidades de uma cochilada, o mar de umas férias, o domingo de uma folga (parágrafo inspirado em ppt que circula na internet em nome do rabino Nilton Bonder).


A igreja insiste em apresentar ao mundo tempos como do Advento e da Quaresma, reafirmando que a vida sem pausa não resiste. Ela avisa. Ela alerta: - Se não parar, vai morrer! Do outro lado o mundo não acredita. Acha o discurso da igreja inadequado, fora de época. O mundo diz: - Falta tempo e a igreja quer que paremos! Isso não! Por isso o mundo resolve enfraquecer a igreja. Não lhe destina recursos. Deixa as obras da igreja morrerem à míngua. A Alemanha acaba de destinar 500 milhões para reformar um prédio, mas as comunidades do terceiro mundo vão coletar dinheiro para reformar a igreja da cidade de Lutero. Para nós brasileiros um dia na praia vale mais que um ano na igreja. O mundo diz: - Ah, a igreja não quer ser como o mundo. Então vamos cortar a sua mesada!


E de repente escutamos um grito: o mundo pede que a igreja ajude a salvar seus filhos que se perdem porque não aprenderam a parar. O mundo pede que a igreja ajude a salvar os seus socialmente desajustados que não aprenderam a parar...


A igreja responde com mais uma quaresma em 2014. Acho que é só mais uma parada forçada nessa rodovia sem acostamento.


Leonídio Gaede
Quaresma de 2011

Um comentário:

  1. Caro colega Zeca! Este texto é também para nós. Obrigado pela boa reflexão.

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