(Mário Quintana)
SENHAS DIÁRIAS
Não temas porque não serás envergonhada. (Is 54.4)
Jesus Cristo diz: Quando, pois, vos levarem e vos entregarem, não vos preocupeis com o que haveis de dizer, mas o que vos for concedido naquela hora, isso falai; porque não sois vós os que falais, mas o Espírito Santo. (Mc 13.11)
O versículo de Isaías vem do contexto de atuação do chamado Segundo Isaías. O Primeiro Isaías dirigia-se ao Reino do Sul – Judá – alertando sobre as ameaças do poder da Assíria. O Segundo Isaías anunciava a esperança no contexto das desgraças de um povo destruído, humilhado e em situação de cativeiro. O Terceiro Isaías concentrava seus conselhos em quem voltava do exílio e pretendia reconstruir Jerusalém.
Já o versículo do evangelho de Marcos vem da terceira parte do livro, onde Jesus atua em Jerusalém e ensina sobre os tempos finais.
É importante observar que são anunciados acontecimentos bons: Jerusalém não será envergonhada! Os discípulos não gaguejarão na hora H! No entanto, Isaías falava enquanto Jerusalém estava justamente sendo envergonhada e Jesus falava aos discípulos enquanto eles estavam justamente gaguejando, com medo de tudo que o Messias estava anunciando que viria, inclusive a destruição do templo.
A questão evoca a imagem do filme e da fotografia. Como pessoas imediatistas, temos dificuldades de levar em conta o filme todo no momento em que ele nos mostra uma fotografia muito marcante. A cena forte do momento pode nos roubar a mensagem da fita completa.
Qual força teve o profeta Isaías para anunciar a inexistência de razões para a vergonha, se a situação do povo era vergonhosa, já há quase meio século? Qual fé teve Jesus de Nazaré para anunciar que os discípulos teriam as palavras certas, no momento em que comentava justamente um futuro difícil?
De onde esses mensageiros de Deus tiravam certezas quando a situação era incerta? A resposta é: de Deus mesmo. A consequência prática, porém, que resultou dessas certezas foi uma postura ética, isto é, uma atuação que contribuiu com a garantia de vida. Eles anunciaram assertivamente o bem, sem que este estivesse presente na visibilidade do momento.
O tempo da quaresma ou Paixão de Cristo é uma fotografia que não faz lembrar os bons tempos que virão no desenrolar do filme. É também um trecho deveras importante para quem entendeu que uma teologia da glória desrespeita a História da Salvação conduzida por Deus desde a arca de Noé, a travessia do Mar e do Deserto até a vinda de Jesus Cristo.
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